domingo, 26 de março de 2017

Homógrafas

Dormimos nos avós, depois de uma noite de borga com os amigos de infância, sabe bem ficar na cama até o corpo deixar de ter posição e as dores de costas ganharem à preguiça e ao frio. Ouvi os pequenos desde muito cedo mas a tranquilidade de saber que o meu pai não os deixa irromper quarto adentro cedo demais, permite-me definhar na cama ouvindo as conversas como se as paredes fossem de papel.
-Avô, avô? - chama macaquito da sala. Como resposta um silêncio anormal.
-Avôôô, anda cá.
Do avô nem sinal, a avó, galinha que é apressa-se até à sala.
-Precisas de alguma coisa, macaquito? - diz-lhe carinhosamente.
-Olha, eu não te chamei, o teu "O" não tem chapéu, tem só um acento, portanto volta lá para as tuas coisas e diz ao avô para vir aqui.

sexta-feira, 24 de março de 2017

Orgulho a dobrar

Ontem chegou da escola radiante, recebeu o teste de inglês, 92%.
-É Muito Bom mamã, sabias?
-Não é muito bom filho, é Excelente!
-Sabes? O F. desta vez conseguiu, 73%.
Valeu a hora e meia de estudo com os dois, ele e o amigo do gato. Nunca me passou pela cabeça que em apenas um final de dia de estudo, com duas crianças autistas, conseguisse tão bons resultados. Ofereci-me para estudar com o amigo porque no primeiro teste, ele não tinha conseguido fazer nada, teve zero, o pai lamentou-se que não o conseguia ajudar. Foi com algum receio que o trouxe pois praticamente só o conhecia em contexto escolar e as reacções destas crianças à mudança de rotinas podem ser desastrosas. Fizemos desenhos sobre o tempo, pintámos as cores, brincámos com vestuário e soletrámos todo o vocabulário em inglês, hora e meia de brincadeira aliada ao estudo, dois resultados brilhantes. 
É isto que me faz feliz, nem imaginam o quanto.

quarta-feira, 22 de março de 2017

Tenho muitos livros por ler

Fomos buscar macaquita à escola e como chegamos 10 minutos antes da hora, saquei do livro que trago sempre na mala e perguntei-lhe se podia ler ou se queria conversar.
-Podes ler mamã, eu fico a ouvir a música.
20 segundos depois.
-Mãe, podes ler!
-Estou a ler, macaquito.
-Mas não estás a mexer os lábios.
Pela primeira vez percebi que ele ainda não tinha entendido que se pode ler em silêncio, na verdade sempre que leio com eles fazêmo-lo em voz alta, eu leio para eles, eles lêem para mim. 


E pensando bem nisto, constato que em 9 anos poucas foram as vezes que consegui ler os meus livros quando estão comigo em casa, a menos que estejam a dormir...

Demasiado

Acordam cedo, demasiado cedo, quando a solo, enfiam-se invariavelmente na minha cama demasiado pequena para três, talvez sejam eles que estão demasiado grandes. Quando a dois, vão para a sala, falam demasiado alto, o volume da televisão no máximo e por muito que lhes esconda o comando estão demasiado espertos e conseguem aceder aos recursos do monitor. Estou demasiado cansada, não me falta a paciência mas por vezes faltam-me as forças e a coragem para me levantar da cama tão cedo quanto eles e fingir que que não vejo demasiadas birras e outras tantas guerras. Tenho demasiada roupa para lavar, faço demasiadas refeições e perdemos demasiado tempo com trabalhos de casa. Falta-me tempo para os cansar, para correr com eles no parque após as aulas, têm demasiada energia quando chegam a casa. Sinto-me demasiado sozinha, demasiado mãe, pouco companheira. Valem-me as gargalhadas, os sorrisos, as parvoíces e os abraços, nunca em demasia. Quando a noite nos aconchega, deito-me demasiado tempo nas suas camas demasiado pequenas para dois e às vezes por lá adormeço. Mesmo assim, há sempre um pequeno nada naquele pedaço de mimo que faz demasiado feliz.

segunda-feira, 20 de março de 2017

Uma coisa nova por dia

Tínhamos planeado uma ida ao planetário, por azar, a consulta calhou no dia da semana em que está encerrado. Prometi que o levaria a um sítio novo, escolhi Alvalade. Comprámos os bilhetes da visita guiada e foi uma paródia. Tenho a certeza que será recordado pelos presentes e pelo guia durante algum tempo. Falou tanto ou mais que o guia, a dada altura apercebo-me que o guia traduzia o que ele dizia aos dois ingleses presentes, apesar de eles se rirem mesmo sem tradução. Já ouviram falar na mítica porta n°10? Todos os presentes foram "coagidos" por macaquito a esfregar o leão antes de passarem por ela, todos os presentes anuíram e foi vê-los a passar a mãozinha no leão dourado. Acho que se criou uma tradição! 

Amor incondicional

Macaquita teve a sua primeira audição de violino, foi a primeira, apresentou-se, apresentou a obra e tocou.... sem desafinar. Ao deitar, elogiei a sua prestação e perguntei-lhe porque não toca assim, quando estuda em casa.
-Porque ali eu tenho de tocar mesmo bem, para as pessoas baterem palmas, não quero que me façam "buuuuuu". Em casa não é preciso, tu gostas sempre de mim!

quinta-feira, 9 de março de 2017

Inversão de papéis

Recebo uma mensagem de uma amiga para irmos beber café, são nove da noite e tinha acabado de deixar em casa um amigo de macaquito que tinha ficado para estudar  connosco. Resolvo ligar porque estava a conduzir e ponho o telemóvel em alta voz. Macaquito ouve a conversa e vai refilando alto porque não quer que eu vá. Depois de combinar tudo com ela passo-lhe o telefone.
-M. não tens nada de convidar a minha mãe para sair, ela já foi contigo na segunda-feira.
-Olha lá Macaquito, a tua mãe é minha às segundas e quartas.
-Não porque às vezes às quartas ela fica em casa.
-Sim, às vezes ela fica contigo mas eu fico sozinha e fico muito triste.
-Mas tu não tens nada de a convidar, eu não quero que ela vá.
-Nem te faz diferença, tu vais dormir agora, nem dás pela falta dela.
-Ok, ela hoje vai. - diz resignado ao perceber que não tem hipótese. - Mas para a próxima quarta não penses que vai ser tão fácil!

sexta-feira, 3 de março de 2017

O Bruno não sai cá de casa

Temos feito muitas recriações a dois (ou três, dependendo da disposição de macaquita) mas hoje sai um solo.

Se quiserem podem deixar as vossas comentações abaixo.