-Mãe, sabes o que é um acólico, não sabes?
-Acólito, macaquita.
-Isso, aquela coisa das igrejas... - explicou. -Noutro dia ao almoço a Bia disse "o meu avô era acólito." E eu "a sério? O teu avô era alcoólico? Coitado!".
-Mãe, sabes o que é um acólico, não sabes?
-Acólito, macaquita.
-Isso, aquela coisa das igrejas... - explicou. -Noutro dia ao almoço a Bia disse "o meu avô era acólito." E eu "a sério? O teu avô era alcoólico? Coitado!".
Enquanto lhe punha creme nas axilas devido a uma irritação provocada pelos "chouriços" da natação, macaquita olha para o umbigo e dispara:
-Não sei porque é que temos de ter cordão umbilical. A gente não vai a lado nenhum. - ri-se do seu próprio disparate.
-Então macaquita, é através do cordão umbilical que o bebé recebe nutrientes e oxigénio... - prendo-me na dúvida, não sabe ou está a gozar?
-Ah bom! Pensei que era para o bebé não fugir, tipo uma trela. - e riu-se muito.
E eu? Eu continuo presa na dúvida...
Hora de jantar.
-Mãe, este arroz tem maravilhas do mar? - levei dez segundos a atingir.
-Delícias, macaquita, delícias! E não, é arroz de polvo.
Deliciam-me estas fragilidades linguísticas dela, não há dia que não me façam rir, como não há dia que não me levem ao desespero. É na escola que mais se nota, tem de trabalhar muito para alcançar metade do que os outros alcançam, tem muita dificuldade de interpretação. Não me preocupam as notas, preocupa-me a saúde mental dela que se sente diminuída em relação aos colegas, por isso, não fala, não pergunta, não tira dúvidas em sala de aula.
Às vezes, inadvertidamente, faço-a chorar quando estudamos juntas, o arrependimento (inútil) chega-me logo de seguida, é quando as lágrimas lhe rolam que compreendo a razão de não fazer perguntas aos professores. A nossa felicidade não é enfeitada, tem dias que se faz de ralhetes, lágrimas, cansaço e medos. Colmata-se tudo isto com beijos e abracos, que sempre sabem melhor que maravilhas do mar.
Segunda-feira, fim de férias:
-Porque é que tenho de ir para a escola? Quem me dera ter um aviário.
Terça-feira, ao deitar:
Eu: -Espero que esta noite não haja passeios noturnos, nem brincadeiras com perfumes.
-Mas mãe, estava cheio de calor e todo transpirado. Aqueles lençóis são muito quentes!
(na noite anterior lembrou-se de ir para casa de banho despejar um frasco de perfume por todo o lado, menos nele. Acordei mais de 20 vezes com a boca a saber a perfume...)
Quarta-feira, depois da escola:
-Porque é que os professores mandam trabalhos? Eles não percebem que a minha vida é muito difícil.
Quinta-feira, ao almoço:
-Mãe, é difícil mandar vir um guarda-costas da internet?
Sexta-feira:
-A Dona G é muito engraçada, ri-se sempre das minhas piadas, mesmo quando são aquelas secas.
Limpo desenfreadamente o vidro da lareira na pressa de a acender visto que a descida das temperaturas já se faz sentir em casa. Macaquita está sentada na secretária em frente ao portátil e macaquito vê televisão com o som demasiado alto. Apercebo-me que conversam mas não ligo ao que dizem até que macaquita arremessa em forma de grito:
-És mesmo burro!
-Ei! Então, sabes bem que não gosto disso. - digo eu.
-Mas mãe, ele não está a perceber nada e só diz asneiras. Eu estava a explicar que vai passar um cometa ou asteróide ou sei lá...
-Meteoro?
-Isso! Vai passar aqui no planeta Terra e é do tamanho de um autocarro...
-Aqui no planeta Terra? - atiro eu com ar de gozo.
-Oh! Lá no espaço mas à volta da Terra... Tu sabes... E ele pergunta "Vai passar em (nossa cidade)? ". Isso é burrice!
-Se calhar ele queria apanhá-lo. - neste momento, macaquito, que se tinha mantido impávido, esboça um sorriso.
-Hã?! O quê, mãe? - diz completamente baralhada.
-O autocarro!